Vou te contar uma anedota. Acabo de receber uma carta de um amigo que conheço desde sempre, na qual me diz que não crê em nada do que escrevo porque “te conheço bem e sei que é muito alegre”, o que demonstra até que ponto pode equivocar-se uma pessoa. Seja qual for meu estado de ânimo, sempre consegui ocultá-lo com um comportamento histriônico. Sou escravo dos meus nervos, mas posso dissimulá-lo, e eu faço isso, comédia que permite, por exemplo, ir a jantes num estado de absoluto desespero e contar estórias frívolas sem parar. Não sei se é pudor ou um mecanismo de defesa, em todo caso, se a minha dependência da fisiologia não fosse tão esmagadora, nunca teria tido que utilizar essa alegria aparente. Claro que isso tem o seu reverso. Kierkegaard conta que ao voltar para casa, depois de ter feito todo mundo rir num salão, só tinha vontade de se suicidar, crise natural que eu pessoalmente comprovei em muitas ocasiões. Agora me lembro que, pouco tempo depois que apareceu o meu livro na França (Breviário de decomposição, 1949), cinco escritores que não me conhecia me convidaram para almoçar. Juro que durante as três horas que durou o almoço eu só falava do bidê. É claro que eles esperavam que eu falasse do meu livro, e até hoje me lembro da sua expressão de desconcerto, enquanto eu continuava falando do desprezo que sentia pelos alemães pelo fato de que eles não têm bidê. É que só posso falar do que me afeta profundamente a sós com alguém: esse momento em que duas solidões podem tentar comunicar-se.